Talvez seja minha natureza meio gótica, o lado sombrio da minha personalidade, mas a Semana Santa sempre teve um grande apelo em mim, apesar de eu ser totalmente agnóstico. É uma temporada de expiação, de introspecção, de penitência, o clímax da estação solene que é a Quaresma. Tudo isso acaba por transparecer nos rituais que acontecem num ritmo lento, sombrio e intenso, que se torna o núcleo de cada tradição da Semana Santa em cada país católico em todo o mundo, independentemente de quão diferente possam ser. Durante algum tempo eu tinha meus olhos postos nas tradições da Semana Santa da Espanha, depois de já frequentar algumas das do meu próprio país. Apesar de estar tão próximo, o país vizinho tende a ser muito mais devoto, a religião desempenha um papel maior nas tradições e que leva a ser vivida de uma forma muito mais apaixonada, mais empenhada e em maior número, e em Espanha na verdade não há feriado maior do que este.
Com tudo isso em mente, eu e meu amigo João Maia fizemos as malas e fomos para o norte da Espanha, há uma infinidade de cidades para escolher (mais uma vez, não há feriado maior do que a Semana Santa), mas acabamos por ir em direção a Zamora, uma cidade pequena com aquela ambiente de cidade pequena e descontraída, que eu gostei tanto na primeira vez que estive lá. Um lugar agradável o suficiente para passar alguns dias, sem ter que contar demasiado com umas procissões de encapuzados, um plano de reserva caso isso acabasse por ser um fracassoí Não foi. À nossa espera havia uma dúzia de procissões, e quando chegamos já tínhamos perdido algumas. Seria uma semana em que cada dia iria ser mais intenso do que o anterior, tanto que quando chegou à Sexta-Feira Santa havia quase um ciclo contínuo de procissões, dia e noite. Quando voltámos de volta a Lisboa estávamos realmente a precisar de descanso.
Como esperado, tudo isso foi vivido intensamente na cidade, as enormes a assistir as muitas e longas procissões (uma das maiores reúne cerca de 5.000 pessoas, logo às 5h da manhã) e é bastante comum ter pessoas participando de vários delas, por toda a cidade é difícil evitar que o que está a acontecer: das várias ruas fechadas a pequenas coisas como os pequenos bonecos encapuzados no balcão do café onde tomávamos nosso pequeno almoço. Hoje quanto mais fotografo celebrações, festivais e afins, mais me sinto atraído pelas pequenas coisas fora do “evento principal”: toda a antecipação com aquela cerveja antes de começar, as pausas no meio, o rescaldo e todas as coisas que vão acontecendo em paralelo. Esse momentos para mim são tão importantes como o que está a acontecer sob os holofotes, e dizem muito sobre como uma comunidade vive as tradições.
As procissões da Semana Santa, todas elas, seguem dentro de momentos..
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